Lyncheana

Uma de suas filhas vivia em uma mansão num bairro nobre, mulher-escrava de um tenente da reserva, dono de uma rede de casas lotéricas. Na mansão, entre os sofás de couro e os móveis de madeira de lei, passeava uma cabra e algumas galinhas. A vivenda da matriarca, porém, era em um casebre de madeira cheio de frestas misteriosas por onde escapava o som da música alegre.
Deslocada, ali estava uma menina de seis anos que, de olhos bem arregalados, absorvia em uma só onda o forró, a mistura do cheiro do churrasco, dos homens de cheiro forte, das mulheres de perfume barato, das crianças com rosto sujo de chocolate e groselha e a luz de lâmpada amarela, fraca e estranha. Ela deteve seu olhar na fonte da música: uma eletrola antiga, dos anos 50. Um móvel compacto, com um tampo que guardava o prato da vitrola. Ao abrir o tampo, à altura de sua cabeça, ela viu o inesperado: em cima do disco de vinil, girando em 33 rpm, havia um enorme besouro de casca vermelha, que parecia um anel de rubi a seguir o ritmo do forró.
2 comentários:
Nada melhor do que ouvir forró numa eletrola dos anos 50. Bem, tem coisas melhores. Tirando as cabras, é claro.
Beijinhos
A sordidez de certos cenários às vezes se revelam de forma poética para quem tem olhos e ouvidos sensíveis.
Muito lindo, Adorei!
Júlia
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