terça-feira, agosto 19, 2008

Feliz aniversário, pai.

Em 19 de agosto de 1927 nascia o primogênito daquela gente com cara de pioneiro da América ou dos egressos da Grande Depressão, olhos apertados do trabalho sob o sol, a dor e vergonha de um tapa na cara, uma fome mal saciada e toda sorte de adversidades que deixava a expressão facial das pessoas daquele jeito específico.
Mas em bebê, foto de 1928, aos oito meses, ele envergava uma camisolinha e uma touca brancas, sentado eretamente defronte a um pano, num estúdio improvisado de fotógrafo de interior. No verso da foto, a caligrafia belíssima do pai, em uma tinta azulada que colocava a data e o nome da criança, filho de um português fugidio com uma mineira endurecida, que no futuro torceria os pescoços das aves cantando as músicas do domingo religioso.
Em outra foto, já rapaz, o objeto era o vigor da postura, em pose de ataque, peito nu, calção, tênis e meia, um bigodinho de cafajeste e um topete de Elvis, antes do Elvis, adornados pelos ameaçadores punhos enfiados em luvas de boxe. Peso mosca, pena no máximo, mas nada mais que isso.
Anos passados, o topete igual, o bigode de mesmo lay-out, o tronco inclinado sobre uma prancheta, desenhando uma ponte, um acesso, uma curva da estrada de Santos, um tunel, um caminho. A foto é diminuta, na verdade um cromo, dos que se guarda na carteira para nunca mais esquecer.
Adiante ele carregava nos ombros, o sorriso esfuziante da felicidade, um guri pelado de fisionomia quase idêntica, um gesto de exibição, um troféu de amor, como se fosse o cinturão da luta vencida há duas fotos atrás. Sem bigode, ele parecia um James Stewart, o topete desalinhado e flutuante como se fosse numa foto submarina.
Na primeira foto colorida, diante de uma mesa festiva, ele ladeado pela esposa e uma garrafa de Pepsi Cola, e rodeados de um burburinho nas cores da época, os braços desnudos, peludos, um corpo bonito.
Por último, uma pança alegre, um sorriso despreocupado, a ex-esposa do lado oposto, a filha caçula no meio sorrindo igual, diferentes na fisionomia, gêmeos na felicidade, a nostalgia antecipada pelo coração que já dava sinais de cansaço.
Dois anos depois ele morreu. Mas nas imagens paira ele, numa posteridade que o presente não apaga, ainda mais nesse legado de nostalgia que parece que é genético.

5 comentários:

A União Faz a Vida disse...

Que lindo, Livia.
:)

isabel alix disse...

oh my. Isso sim, é escrever.

Anônimo disse...

Ah, saudades...de ti e do teu talento para encantar e cantar e ser tão...ESPECIAL

Astro!
Aqui, para te fazer brilhar!...
(Mas, nem precisa:você tem luz própria!...)

Joelma Terto disse...

tu é foda.
ponto.
pronto.

Liv Araújo disse...

ô Astro! Quem é vivo sempre aparece. ;-)