sábado, novembro 12, 2005

Red Velvet




Tal como a neve manchada do sangue de um crime de amor, naquela tarde de inverno ela vestia vermelho, por inteiro. Do pescoço para baixo ela recendia a cerejas frescas, a batom Lancôme e a idílios etílicos. Na verdade, era uma tarde qualquer da semana e a mão vinha carregada de pastas e no corpo lhe pesava uma bolsa. O que continha em seu interior? Talvez nunca saibamos. Fato é que debaixo de lã e veludo e elastano havia a pele morena. Debaixo da pele, são veias e microveias e músculos e, sob eles, subtraindo as pilastras dos ossos, um microcosmo avermelhado e cheio de reentrâncias. Aqueles sons esponjosos mas tão quentinhos e o bombear constante do coração, claro. Naquele momento em que ela corria para pegar o ônibus, tão esbaforida, o sangue ia feito louco como num acelerador de partículas. Ela me amava mas, mesmo que eu fosse um daqueles átomos ricocheteando em todas aquelas entranhas avermelhadas em que eu queria estar, misturada ao sangue, ao muco, e mesmo aos humores produzidos por quaisquer glândulas, eu só podia ver a maciez do veludo vermelho de sua linda calça. Cotelê.

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