Eu era pequenininho-burguesa
Da época em que todo mundo queria ser adulto
Durante o 2º grau, eu tive uma colega que era a esquisita do colégio: transferida de uma outra escola, ela chegara usando pendurada no pescoço uma enorme chupeta de plástico, com uma franja crespa que lhe caía na frente do olho, o rosto manchado de um vermelho que parecia micose e muitas cicatrizes pelos braços e pernas. Ela fumava na hora do recreio em pleno pátio mas não afrontava os professores. Ela não raspava as axilas e ninguém sabia que tipo de música ela escutava. Não obstante, ela foi parar na minha sala e em poucos dias começamos a andar juntas. Aos 16 anos, lia Rimbaud, Bukowski, escrevia poesias que não rimavam, ia da noite direto para a aula, de manhã, e dizia-se que transava com mulheres. Eu falava dos livros que eu lia, das aulas de francês, de como eu era a fim do menino de calça rasgada e coturnos do terceiro ano, de como eram importantes as eleições do grêmio estudantil.
Talvez as únicas coisas que tínhamos em comum era a adolescência e a dificuldade com matemática. Por isso, passamos cerca de um mês estudando juntas umas duas vezes por semana, a tarde toda, as malditas matrizes e as progressões aritméticas e geométricas. Na primeira vez em que iria à casa dela, pintei um quadro maravilhoso: eu chegaria lá, fumaríamos narguilé ou um baseado, ninguém conseguiria estudar e ficaríamos falando de literatura, tomando uísque com gelo e comendo amendoinzinhos infectos.
E então eu cheguei lá, e a mãe dela, enquanto estudávamos na mesa de jantar, trouxe leite com Nescau e rosquinhas de côco. Uma delícia.
3 comentários:
Prazeres da adolescência. Na fase adulta não pega bem gostar de rosquinhas de coco (mas eu gosto).
Eu ADORO as tuas histórias. Ficaria a tarde toda ouvindo... :*
que delícia esse texto!
tu queria era só bagunça, né, danada!
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